Serviço militar obrigatório e a falta de organização generalizada

September 21, 2021

Todos os anos, mais de 1 milhão de jovens se alistam para “concorrer” ao desnecessário Serviço Militar Obrigatório nos 5570 municípios do Brasil, mas, atualmente, 921 são municípios tributários, ou seja, onde tem Serviço Militar (de acordo com o PGC 2022). A vasta maioria dos brasileiros – de civis a militares – desconhecem um direito fundamental previsto na Constituição Federal (CF), que é o direito à Escusa/Objeção/Imperativo de Consciência (vamos usar Imperativo, pois é assim que está escrito no Art. 143 (Leiam a L8.239/91 e Portaria 2.681 do COSEMI também). Direito este reconhecido pela ONU e datando da época de Maximiliano de Tébessa, mas considerado crime em países como a Coréia do Sul. 

Há muito a ser discutido sobre tal tópico, mas vou focar este pequeno texto na falta de divulgação do tema. A princípio, parece tudo muito simples, basta analisarmos o artigo 143 da Constituição Federal, como descrito abaixo (grifos meus):

Art. 143. O serviço militar é obrigatório nos termos da lei.

  • Às Forças Armadas compete, na forma da lei, atribuir serviço alternativo aos que, em tempo de paz, após alistados, alegarem imperativo de consciência, entendendo-se como tal o decorrente de crença religiosa e de convicção filosófica ou política, para se eximirem de atividades de caráter essencialmente militar.

Contudo, o procedimento para declarar Imperativo de Consciência é totalmente mal feito, confuso, controverso, ignorado, desconhecido, debochado, difícil e demais palavras parecidas, pois nos casos em particular das pessoas que entraram em contato diretamente comigo de outubro de 2019 para cá (quando consegui minha dispensa) e dos comentários das entrevistas e matérias em que fui citado e fiz a leitura, TODOS precisavam ser associados à uma instituição política, filosófica ou religiosa para provar que têm tais convicções, ou seja, o Estado solicitava que você fosse associado a uma instituição, reconhecer firma em cartório e só assim para você provar suas convicções de vida. Faz sentido um absurdo desse? Óbvio que não!

Toda essa discussão que estou levantando já passou pelo MPF, TRF4, STF (RE 826550), e desde 2008 o Ministério Público Federal de diversas regiões do Brasil vem correndo atrás da implementação do inexistente Serviço Alternativo, porém somente em 2019 encaminhou ao Ministério da Defesa (MD) a RECOMENDAÇÃO PRDC/RJ/Nº 08/2019, apontando todos os empecilhos e dificuldades impostas ao cidadão, recomendação esta já cumprida por parte do MD e inclusive já arquivada, da qual fazia parte do Inquérito Civil IC 1.30.001.000690.2019-11, mas mesmo assim não adiantou absolutamente nada até meados de setembro de 2021. Ou seja, em teoria, atualmente não se faz necessária nenhuma declaração de entidade política, religiosa ou filosófica, com firma reconhecida, sendo suficiente o jovem requerer o inexistente Serviço Alternativo através do apêndice 16 do anexo S da Portaria 326 de 2019 do DGP, explicar suas motivações e ser automaticamente dispensado, conforme conjuntura atual, mas a falta de conhecimento e divulgação a respeito do tema é tão grande, mas tão grande, que em algumas Juntas de Serviço Militar estão seguindo a NT-03, que foi revogada pela portaria já citada do DGP. Nas raras vezes que o(a) secretário(a) da JSM sabe de alguma coisa, avalia e diz que apenas religiosos podem solicitar o Certificado de Dispensa do Serviço Alternativo (CDSA), o que não é verdade. Mas não para por aí, pois ainda temos muitos outros problemas, como nos sites da Diretoria de Serviço Militar (DSM) e do Departamento Geral do Pessoal (DGP) e outros sites subordinados ao exército e MD vários links para download das normas e leis que se referem ao tema não estão disponíveis para download, várias vezes as páginas não abrem, os sites são muito confusos e houve uma certa demora para publicarem a Portaria 326 de 2019 do DGP no site da DSM, que determina basicamente todo o funcionamento de uma JSM.

Devemos nos lembrar que todo o procedimento começa pela JSM, órgão que normalmente é de responsabilidade da prefeitura. Em teoria, bastaria o jovem requerer o Serviço Alternativo para ser encaminhado ao processo seletivo, mas como simplesmente não existe Serviço Alternativo algum, é automaticamente dispensado (conforme DIEx 190 e Portaria 326 de 2019 do DGP). Ocorre que em virtualmente todas JSMs ninguém sequer sabe o que é isso, nunca leu o artigo 143 da Constituição e no máximo dizem que isto só vale para motivação religiosa, mas o direito ao Imperativo de Consciência independe de religião, opinião política, posição filosófica, cor de pele, orientação sexual, ou qualquer outro óbice inventado por secretários das JSMs que demonstram não fazer ideia do próprio trabalho. Aliás, transexuais são dispensados também, basta ler a já repetida PORTARIA 326 DE 2019 DO DGP. Por diversas vezes eu tive de entrar em contato diretamente com o Comando do Exército (CEX), pelo portal FalaBR, pois simplesmente não existia determinada informação na internet. Em resumo, deixo abaixo apenas um pouco de tudo que sei a respeito do tema:

  • Apesar de no ato do alistamento o jovem ser questionado se quer servir ou não, tal opção querer (ou não) servir, não é levada em consideração, ou seja, é ignorada;
  • Temos 5570 municípios no Brasil, mas destes 921 são tributários, ou seja, milhares de cargos públicos desnecessários, pois nos outros municípios não tributários o jovem recebe o CDI e não precisa servir e em minha visão nem haveria necessidade de existir JSM em tais municípios;
  • Os próprios militares dizem que o número de voluntários é suficiente (então para que manter a obrigação de alistamento, haja visto que aproximadamente 5% dos alistados são incorporados?);
  • A obrigatoriedade contribui para o desemprego, pois, conforme art. 472 da CLT, o jovem não pode ser demitido por seus deveres militares, ou seja, muitas empresas sequer contratam o jovem, pois não poderiam demitir caso ele fosse convocado;
  • Me informaram que o Ministério da Defesa está estudando a implementação do Serviço Alternativo;
  • A declaração de Imperativo de Consciência não deveria ser limitada a tempos de paz ou a qualquer outro limite, seja em tempos de paz ou guerra, conforme artigo 143 da Constituição Federal;
  • O alistamento e Serviço Militar Obrigatório não deveriam existir;

Em suma, do que adianta colocar um uniforme em alguém que está completamente desmotivado para isto? EU RESPONDO: Além de literalmente destruir uma etapa na vida do cidadão, o dinheiro gasto em todo este “Processo Seletivo” não dará nenhum retorno ao país! Por fim, a obrigatoriedade é uma ideia retrógrada numa nação que já não investe no efetivo militar que já existe.