O que significa a decisão do STF sobre terceirizações?

August 31, 2018

A primeira coisa que você precisa saber sobre a terceirização é que ela já era legal. Os TRTs, o TST, as Procuradorias do Trabalho e todos os órgãos públicos já praticavam a terceirização. Durante algum tempo, esses mesmos órgãos entendiam que ela era completamente ilegal. Depois, criaram a distinção entre atividades-fim e atividades-meio, liberando a terceirização apenas para as últimas.

O problema é que nem sempre é possível saber o que é uma e o que é outra. Hoje, os próprios tribunais do trabalho terceirizam atividades como limpeza, recepção e segurança (até um dia desses, havia concurso para isso), mas eles podem terceirizar contabilidade? E auditoria? E TI? A manutenção do sistema de computação é uma atividade-fim ou meio?

Entendem a complexidade? Se essa dúvida existe num tribunal, avalie numa empresa privada. Um hotel pode terceirizar a área de eventos? O restaurante? O bar? A limpeza da piscina? Serviço de lavanderia? Até um tempo atrás, a Justiça do Trabalho considerava que call center era terceirização ilegal, pois atendimento ao cliente era atividade-fim das indústrias ou lojas. Hoje, não entende mais assim.

Enfim, como qualquer advogado sabe e, mais ainda, como qualquer empresário sabe, definir sobre se a área é fim ou meio é muito difícil. E a decisão sobre terceirizar ou não é uma decisão sobre eficiência administrativa. Proibir a terceirização é impedir a criatividade e o surgimento de novas pequenas empresas, criativas e especializadas. É bloquear a geração de vários novos empregos. No mais, basta garantir algum tipo de responsabilidade do tomador de serviço ou outro tipo de garantia, que as preocupações sobre “precarização” deixam de existir.

Eu pergunto, portanto: em que sentido a proibição da terceirização beneficia o trabalhador? Num país com 12 milhões de desempregados, acho que a resposta está dada. Percebam, portanto, que a revolta contra a terceirização não é uma revolta contra a “perda de direitos”, pois perda não há. A CLT e suas restrições duras ao contrato de trabalho continuam vigendo e continua sendo imensamente difícil e caro contratar alguém no Brasil. A terceirização é um contrato entre empresários. É forma de gestão dos negócios. Uma forma de desburocratizar a empresa e de inventar novos meios para suprir necessidades sociais. Em nada altera o contrato de trabalho, que continua regido pela CLT.

A revolta contra a terceirização, na verdade, é a revolta contra o capitalismo e a inovação que ele proporciona. No âmbito do direito, é o reacionarismo puro e simples, que não quer que nada mude e que o direito se torne cego às inovações sociais. Por isso, mesmo sem a existência de uma lei que proibisse a terceirização, o TST considerou, no geral, a sua ilegalidade (apesar de admitir exceções). O Tribunal se manteve preso à ideia de que, no direito legislado do trabalho, o que não está expressamente permitido, é proibido.

A necessidade de uma lei autorizando a terceirização e de uma decisão do STF sobre o assunto é um retrato do positivismo jurídico vulgar que vigora no nosso país, em que qualquer inovação social que não venha dos iluminados é vista com desconfiança e medo, onde todo o direito deve ser comandado por uns poucos experts, imposto de cima para baixo e desconsiderando toda a dinâmica social. Na verdade, a terceirização é pouco. O certo mesmo era um direito do trabalho totalmente contratual (individual e coletivo).

É necessário revisar completamente a CLT. Por enquanto, dá para comemorar essa decisão do STF.

Ainda há juízes no Brasil.