Roberto Ellery: “Gestão de Guedes é pior do que a Dilma”

October 27, 2021

Economia

Sob o comando do ministro Paulo Guedes, o balanço da gestão econômica do governo Bolsonaro até aqui já é pior do que o desastre promovido pelo governo Dilma. Essa é a avaliação do professor Roberto Ellery, do departamento de economia da UnB e um dos maiores críticos da gestão econômica sob a presidência de Dilma Rousseff. “É um governo que está perdido. No governo da Dilma, apesar de eu ter sido contrário e criticado muito, havia um plano. Eu acho que daria errado de qualquer jeito, mas teria alguma consistência. Hoje não tem nenhuma”, compara Roberto. “O que você tem é uma rendição completa ao núcleo do centrão no Congresso”, explica.

O rompimento explícito da política de teto de gastos se tornou evidente para todos nas últimas semanas, mas não pode ser considerado uma surpresa para observadores atentos da política econômica. “Os indícios já estavam dados desde antes da pandemia. Ficou muito claro desde a Reforma da Previdência, que foi importante, mas protegeu os militares, categoria apoiada pelo presidente”, criticou.

Para Ellery, não podemos descartar a hipótese de que Paulo Guedes desistiu de cortar gastos e substituiu o ajuste fiscal por inflação. “Como o imposto é uma alíquota, a receita do governo sobe quando os preços sobem. Se o gasto fica parado, há um ajuste inflacionário. As vezes eu acho que o Guedes queria isso. Ele viu que não ia reduzir nem controlar salário de servidor e pensou em pegar os caras com inflação. O problema é que depois é difícil controlar, como aprendiz de feiticeiro”, explica.

“Se o processo inflacionário voltar com força, acabou. É só lembrar o Brasil de antes: ninguém discutia reforma porque não tinha como. A inflação se impõe como problema. Se ela sai de controle, o dano é muito maior. Olha para Argentina pra ver o que acontece. E não adianta brigar com os preços. A inflação é uma doença da moeda”, alerta Ellery.

Falta liberalismo

Ao analisar a prática da política econômica de Paulo Guedes, não há indícios consistentes de uma tentativa de aplicação dos princípios do liberalismo econômico de qualquer vertente teórica. “Você pode ser da turma do Hayek ou da turma do Friedman. É difícil entender um governo liberal que não tenha uma obsessão pelo controle da inflação. Se você pegar as grandes escolas liberais da economia, todas tem obsessão pelo controle inflacionário. Se você pega a Escola Austríaca – e o ministro Paulo Guedes gostava de mostrar livros do Hayek e do Mises -, a base da teoria dos ciclos econômicos é que os juros baixos distorcem a alocação de capital. E o governo fez isso. Onde estavam os meus amigos austríacos, que não se descabelaram gritando?”, questiona o professor.

Outra metamorfose profunda entre o discurso de Paulo Guedes antes de se tornar ministro e a prática demonstrada da sua política econômica ocorre no âmbito da abertura comercial. “Paulo Guedes começou o governo falando em abertura. O discurso dele era de íamos proteger a indústria dos industriais. Logo depois, ele passou a dizer que precisamos dar um tempo para as empresas se adaptarem. Nós estamos a 70 anos dando tempo para as empresas se adaptarem. É a gestação mais longa da história da humanidade”, critica Roberto.

Ao comentar a situação do câmbio, Ellery também chamou atenção para a prática desenvolvimentista de proteção do mercado nacional. “O próprio Paulo Guedes falou de proteção da indústria nacional. Disse que o câmbio desvalorizado ia ajudar a indústria nacional, que os brasileiros deveriam fazer turismo no Brasil e de que domésticas tem que parar de ir pra Disney. Tudo isso é o velho discurso desenvolvimentista. Eu ouvi o Ciro dizer isso em um debate com ele”, provocou Ellery.

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