Condenação da Folha ameaça imprensa livre

April 9, 2018

Costumamos colocar a censura fora da atualidade, reservando-a aos livros de história. Mas ela está presente no nosso cotidiano, principalmente de quem depende do discurso e da palavra para fazer seu trabalho.

Prova disto ocorreu nesta semana, quando a Folha de S. Paulo foi condenada a indenizar R$30 mil a cada um dos três promotores que se sentiram ofendidos por certos adjetivos usados sobre eles num editorial.

Editoriais, por sinal, são caracterizados por terem uma ótica, uma opinião clara em sua construção. Daí vem o surrealismo extra da decisão do juiz Marcos Duque Gadelho Júnior, da 23ª vara do foro central cível de São Paulo.

Para Gadelho Júnior, a Folha não pode criticar usando “palavras ultrajantes” como “sede de celebridade”, “ignorância” ou “paixão persecutória” para caracterizar a prisão preventiva do ex-presidente Lula.

Não estamos aqui para discutir, obviamente, a decisão comentada pela Folha, mas o direito da instituição em escrever e publicar sua posição.

Afinal, já dizia o escritor George Orwell, famoso pelas críticas a opressão governamental em livros como 1984: “Liberdade significa ter o direito de dizer às pessoas o que elas não querem escutar.”

Ora, se temos o princípio da liberdade de informação e expressão como constitucionais, porque há espaço para que um juiz obrigue um jornal a pagar inacreditáveis R$30 mil reais a cada um dos promotores que se sentiram ofendidos pelo texto?

Com brechas para abusos desse tipo, a liberdade de expressão pode virar vítima da polarização política que estamos presenciando. Precisamos de lucidez para não perdermos o foco nos valores da liberdade – e não acabarmos contribuindo para a polarização que continuamos a criticar.