Do Chile, da Alemanha, e do interior do país: uma resolução para o Brasil de 2022

January 17, 2022

Comércio exterior

O ginásio mais parecia uma sauna. Voltei de um encontro pela renovação política em São Paulo e fui assistir o time de futsal da minha cidade, Cascavel, no interior do Paraná, disputar a final da Liga Nacional de Futsal de 2021 contra o Sorocaba. Quase nada é mais brasileiro que acompanhar a bola sendo chutada até a meta. No ginásio para assistir a disputa, inédita pra cidade, ecoavam na minha cabeça as conversas que havia tido no encontro em São Paulo. Alguns amigos haviam enaltecido minha posição de Coordenador Internacional do Livres enquanto eu enfatizava a simplicidade do trabalho: basta olhar o que vem funcionando fora do país e dialogar politicamente para tentar replicar no Brasil as medidas que fazem sentido para nossa realidade.

Quando o jogador Rodrigo, do Sorocaba, entrou na quadra, também passaram a ecoar na minha cabeça os xingamentos da torcida contra ele. Jogador de seleção, Rodrigo sabe ser nêmesis. Entrou pro aquecimento devolvendo as provocações da torcida. No jogo, entretanto, sumiu. O Sorocaba sucumbiu à serpente – o 6×0 no placar (eletrônico, diga-se de passagem) era incontestável. Ao final, Rodrigo cumprimentou os heróicos jogadores, a comissão técnica e a diretoria do Cascavel um a um. Ainda no ônibus que levava o time do Sorocaba para longe do caldeirão no interior do Paraná, postou uma mensagem nas redes sociais parabenizando o Cascavel pela gigantesca conquista. Havia passado a hora de provocar e restava apenas abaixar a cabeça e se preparar para disputas futuras.

Ao mesmo tempo, bem mais longe do calor do ginásio, do outro lado do continente, se desenrolava o segundo turno das acaloradas eleições chilenas. Esquerda contra extrema-direita, numa polarização que de alguma maneira parecia replicar o que possivelmente nos espera pro Brasil de 2022. O esquerdista (mas que, aparentemente, pode realizar algumas reformas liberais) Boric derrotou o populista de direita Kast. Os votos nem haviam sido todos contabilizados quando Kast postou mensagem nas redes sociais parabenizando Boric e dizendo que se iniciava um período de “colaboração construtiva” pelo Chile. Havia passado o período das provocações eleitorais e chegava a hora da convergência e da boa política. Na Alemanha, que substituiu em eleições a chanceler Angela Merkel há cerca de duas semanas, depois de 16 anos, o diálogo e a boa política também foram a toada do período eleitoral: Olaf Scholz, que era ministro da própria Merkel, conquistou o cargo de chanceler ao formar uma coalizão entre os Social-democratas, os Verdes e os Liberais.

Olhando não só para fora, como observador internacional pelo Livres, mas também pro interior do país, como bom torcedor, fica evidente que o diálogo funciona para extinguir tensões exacerbadas e permitir que o jogo siga. Aqui, entretanto, apesar de sermos vistos por estrangeiros como um povo receptivo e que gosta de conversa, nos tem faltado diálogo. Conseguimos, surpreendentemente, renovar de maneira recorde nossa Câmara dos Deputados em 2018 e, ao mesmo tempo, envelhecer nossa política: entraram novos representantes pouco interessados em conversar com seus colegas e, assim, os velhos caciques que ficaram no Congresso vêm podendo deitar e rolar em busca de seus interesses próprios. A falta de diálogo só vale a pena pros que nunca quiseram ouvir as ânsias da sociedade.

Nas redes sociais, as campanhas agora parecem permanentes. Ficamos só no campo eleitoral e divisivo e esquecemos da convergência política pelo que é fundamental para matar a fome de tantos brasileiros. Apesar de já sabermos que as reformas necessárias para a recuperação da nossa economia (administrativa e tributária, para começar) só avançam com apoio em massa da sociedade, nossa sociedade segue dividida e alguns nem querem que a bola role – antes mesmo das eleições, o que rolam são as fake news sobre todos os candidatos, contestando-se até mesmo a urna eletrônica. As instabilidades que nutrimos afastam amigos, investidores estrangeiros, e afastam o Brasil do progresso. Já basta.

A boa política precisa voltar para dentro de casa. No mundo todo, mais fundamentalmente que quaisquer políticas públicas específicas, o diálogo em torno de ideias e das pautas que importam pro país (e não o xingamento ou sopapo contra as pessoas que reprovamos) é que proporciona o avanço. Provoco aqui: não dá mais pra ficar só na provocação e esquecer da convergência. Em 2021, o desejo de ver meu Cascavel campeão nacional se materializou. Em 2022, então, terei uma nova resolução para o ano eleitoral no Brasil: retomar o diálogo pragmático até com quem eu reprovo, antes e depois das urnas. Espero estar acompanhado nessa meta, até porque nada é mais brasileiro que a boa conversa.