A economia, o otimista e o cético

November 13, 2019

Economia

OTIMISTA: “Mas a economia, pelo menos, você concorda que vai bem, né”?

CÉTICO: “Não.”

OTIMISTA: “Como não? Menor taxa de juros de todos os tempos!”

CÉTICO: “O que está baixo é o juro do governo: o juro na ponta, para quem toma crédito, continua alto. Por isso o governo agora mandou a CEF reduzir os juros ao consumidor. Não é lindo? Um liberal de Chicago como o Guedes usando banco oficial para interferir no mercado e baixar juro por decreto, igualzinho à Dilma? Ele deveria privatizar a Caixa e o Banco do Brasil, reduzir a concentração bancária e estimular a concorrência, isso, sim. Mas Bolsonaro proibiu. Por falar nisso, Guedes prometeu privatizar 200 estatais em 2019, e não privatizou nada. Zero. O pouco que se privatizou foi planejado pelo Temer, e Guedes não participou. Mas, enfim, reduzir a taxa básica de juros não é mérito: com essa inflação, é obrigação.”

OTIMISTA: “É a menor inflação de todos os tempos!”

CÉTICO: “A inflação baixa é resultado da baixa atividade econômica. É mau sinal.”

OTIMISTA: “Mas o país está crescendo!”

CÉTICO: “Muito pouco, perto de 1%.”

OTIMISTA: “Também, com a devastação que o PT fez, demora mesmo para retomar. Uma hora a crise ia chegar, estamos pagando o preço.”

CÉTICO: “Estamos pagando o preço já há cinco anos. Aliás, o PT já está fora do governo há três anos, e o país voltou a crescer já no ano seguinte, de modo que, a esta altura, deveríamos estar crescendo muito mais do que estamos — tanto assim que a expectativa de crescimento no início do ano era três vezes maior do que vai ser. Se está tudo bem, como você diz, por que vamos crescer menos em 2019 do que crescemos em 2017 e 2018?”

OTIMISTA: “Mas o risco-país nunca esteve baixo…”

CÉTICO: “O risco-país baixo indica que há pouca chance de o país dar calote na dívida, não tem ligação direta com a economia ir bem ou não. Repare que o dólar está alto, o que não é sinal de confiança na economia. O risco-país caiu por causa da reforma da Previdência e porque o juro baixo diminui o custo da dívida.”

OTIMISTA: “Mas a reforma da Previdência você não vai negar que foi bom, né?”

CÉTICO: “Muito bom, melhor coisa até agora. Mas o governo fez tudo errado na articulação na Câmara, a tramitação atrasou meses, e só passou porque Rodrigo Maia fez o trabalho do governo. No Senado, o governo se concentrou em fazer do Zero Três embaixador, e nem viu o quanto a reforma foi desfigurada. A reforma saiu tarde e pior.”

OTIMISTA: “Mas passou.”

CÉTICO: “Sim, mas a verdade é que quase qualquer outro candidato teria feito a reforma, era inevitável. E se a reforma tivesse passado no primeiro semestre, como se esperava, poderíamos ter discutido a reforma tributária e a administrativa. Por falar nisso, o governo nem sequer tem proposta de reforma tributária — a que tinha, da CPMF, era péssima e implodiu — e só agora apresentou a administrativa.

OTIMISTA: “A reforma administrativa é excelente!”

CÉTICO: “Sim, um grande passo à frente — mas tem que passar. E se o governo encaminhar com a mesma competência que encaminhou a da Previdência, não vai passar, de modo que vamos deixar para falar dela um pouco mais para a frente.”

OTIMISTA: “E a bolsa? A bolsa bate um recorde atrás do outro!”

CÉTICO: “A bolsa não reflete a economia real. A bolsa reflete uma percepção do mercado sobre o futuro, e essa percepção às vezes está errada — bolhas existem —, e a bolsa pode cair tão rápido quanto subiu. Lembre-se também de que o índice da bolsa não representa todas as empresas, mas apenas um pequeno conjunto, as mais negociadas. E a bolsa não investe nem dá emprego. Mais importante do que a bolsa é a taxa de investimento, e essa está no nível mais baixo dos últimos 50 anos.

OTIMISTA: “Mas a imprensa também não ajuda!”

CÉTICO: “A imprensa não tem que ajudar ninguém. Esquece isso. Pergunta para o Lula e para a Dilma e para o FHC se eles gostavam da imprensa. A primeira coisa que o Lula fez ao sair da cadeia foi xingar a Globo, por sinal.”

OTIMISTA: “Então você acha que está tudo péssimo?”

CÉTICO: “Não, as coisas estão melhorando — só que mais devagar do que deveriam. Guedes não é essa maravilha que querem fazer crer, mas é parte da solução. Só que Guedes não é mágico. Não é fácil criar um ambiente de estabilidade e confiança que atraia investimentos com Bolsonaro criando uma crise por semana. Não existe ministro da Economia que dê jeito nisso — e isso não vai mudar.”