Ibaneis tem que escolher: modernizar o DF ou servir a interesses corporativistas?

January 14, 2020

O Distrito Federal vem enfrentando turbulências políticas e financeiras nos últimos anos, tendo começado com o escândalo que derrubou o então governador José Roberto Arruda em 2009. A crise política desembocou na eleição de Agnelo Queiroz (PT) em 2010.

O governo Agnelo foi o grande responsável pela grave crise financeira que vivemos até hoje. Sua gestão irresponsável e eleitoreira concedeu aumentos a inúmeras categorias, preferindo premiar o corporativismo do serviço público a criar condições fiscais sólidas para investimentos públicos de qualidade. Apostou-se em aumentos salariais e na construção do Estádio Nacional, recheada de denúncias de corrupção e – no melhor cenário – uma corrupção das prioridades enquanto escolas caíam aos pedaços e pacientes sofriam em filas nos hospitais.

A gestão de Rodrigo Rollemberg (PSB), com seus altos e baixos, foi importante para controlar o caos fiscal vivido a partir da crise econômica, que derrubou também a arrecadação dos estados. Apesar do esforço, faltou força política ao governador para fazer reformas fiscais estruturais e duradouras. O esforço fiscal do governo, liderado pela competente secretária Leany Lemos, teve elevado custo político. Em 2018, como resultado, Rollemberg perdeu a disputa de sua reeleição para Ibaneis Rocha (MDB), que embora novato em disputas eleitorais, foi Presidente da OAB no Distrito Federal e Diretor do Conselho Federal da entidade.

Era particularmente difícil estabelecer expectativas para o governo de Ibaneis, justamente pela sua falta de experiência administrativa. Algumas de suas promessas eram condizentes com o velho populismo conhecido da população do Distrito Federal. Falava-se em pagar a terceira parcela do aumento dos servidores ainda em 2019 (não se cumpriu); em aumento salarial para a Polícia Civil, para a Polícia Militar e para os Bombeiros Militares (ainda em negociação com o presidente Jair Bolsonaro). Soma-se a isso a estapafúrdia ideia de se criar uma universidade pública distrital em um cenário de restrição fiscal elevada.

Um ano depois, o que podemos verificar do governo Ibaneis é um vai e volta entre novas e velhas práticas políticas que fazem o governo apontar para medidas benéficas enquanto ainda acena para os interesses corporativistas do funcionalismo público distrital.

Em primeiro lugar, é louvável a ação do GDF no sentido de privatizar empresas públicas como a CEB Distribuição, a CAESB e o Metrô, a primeira com leilão previsto já para o começo de 2020 e as demais ainda em etapa de estudo. É preciso que o governo atue com vigor no sentido de promover tais privatizações, que de acordo com o próprio GDF podem arrecadar cerca de 8 bilhões para os cofres distritais. É também preciso reconhecer o avanço representado por uma política distrital de incentivo a carros não poluentes, inclusive com 16 carros elétricos para uso compartilhado de servidores públicos.

Cumprindo também promessa de campanha, o GDF criou política para que presidiários trabalhem na restauração de espaços públicos. De acordo com o governo, há algo em torno de 1500 presidiários prestando serviço ao GDF, sendo 90% na restauração de espaços. Tal política difere de uma mentalidade meramente punitivista de forçar o trabalho dos presos.

No âmbito da educação ainda há muito a avançar. Em primeiro lugar, fica a ideia de que a única política do governo para a educação é a adoção de gestão compartilhada das escolas com a Polícia Militar. É preciso reconhecer o avanço que algumas escolas de gestão compartilhada estão tendo, principalmente nos casos em que havia alto índice de violência. O problema é tratar esse modelo como se fosse uma política de Estado para educação. Em primeiro lugar, esse formato não vai solucionar o baixo desempenho do DF em índices educacionais. Em segundo lugar, fica a dúvida de por que o GDF trabalha apenas com gestão compartilhada com a polícia quando poderíamos avançar também para o compartilhamento com Organizações Sociais, que poderiam ajudar muito na melhora dos índices.

Do ponto de vista da primeira infância o governo ainda patina dado o imenso déficit de vagas para creches no DF. Mais do que isso, há ainda muita confusão sobre a lista de espera de vagas em creches, com muito pouca transparência. Já no Ensino Médio, o governador cumpriu a promessa de ampliar o número de vagas de ensino integral. De janeiro a novembro foram criadas 1,2 mil vagas de ensino médio integral. Muito dos avanços na área são fruto do bom trabalho desempenhado pelo secretário Rafael Parente, que foi dispensado pelo governador por não aceitar a decisão de impor a gestão compartilhada em escolas que haviam votado para não tê-la.

Uma característica própria do Distrito Federal é a grande quantidade de bairros de classe média alta com terrenos e casas de alto padrão sem escritura. Planejada, mas não iniciada por Rollemberg (PSB), a regularização fundiária desses condomínios ganhou agilidade em 2019, sendo executada gradualmente por Ibaneis Rocha (MDB). Entretanto, a construção de drenagens e vias pluviais nesses mesmos bairros (a maioria iniciada na gestão passada) chegou a ser paralisada por alguns meses também pelo atual governador.

Há muito a avançar. O governo ainda patina na área de saúde, com demissões em série de gestores de hospitais sem que medidas efetivas sejam tomadas para solucionar os graves problemas da área. Houve avanço com a expansão do Instituto Hospital de Base (terceirização da gestão do hospital feita no governo Rollemberg) para outros hospitais, mas a situação ainda é crítica na rede pública de forma geral.

É lamentável também que o governador queira ainda ceder às pressões corporativistas das polícias, concedendo aumento de 8% para elas e bombeiros militares. Em um cenário de restrição fiscal, não parece condizente aumentar a despesa obrigatória do GDF, beneficiando corporações que já são algumas das mais bem pagas do país, sem garantido retorno à sociedade. Cabe ressaltar que o maior salário inicial de policiais militares do país já é o do Distrito Federal. Além disso, os escrivães e investigadores da Polícia Civil do DF recebem o segundo maior salário da categoria no Brasil.

Outra dificuldade, que não é inovação desta gestão, é a dificuldade vivida pela população no transporte coletivo. O GDF anunciou nesta semana um reajuste de 10% nas passagens de ônibus, o que tem revoltado os usuários, que pagam passagens caras para um transporte de péssima qualidade. E o pior: os repasses do GDF para as empresas que oligopolizam o transporte coletivo do DF só aumentam. Em 2014 foram repassados 202 milhões de reais às empresas. Esse valor foi subindo ano a ano e atingiu 700 milhões em 2019. O aumento dos repasses tem também a ver com a política de passe livre estudantil – que de livre, obviamente, não tem nada. A “gratuidade” das passagens para estudantes encareceu o sistema para todos os outros usuários, mesmo com a importante reforma do passe livre feita pelo governo Ibaneis no começo da gestão. O fato é que não parece haver, por parte do governo Ibaneis, vontade política de alterar o modelo ineficiente e caro do transporte coletivo de Brasília, controlado por algumas família já há muitos anos.

Houve avanços nesse primeiro ano de gestão do governador Ibaneis Rocha, mas o governo ainda patina bastante em áreas cruciais como saúde e educação, cujos problemas sabemos ser complexos. Falta ainda por parte do governo um programa de desburocratização que venha a facilitar a vida do empreendedor, bem como um projeto econômico sustentável para fazer com que a capital perca sua dependência do setor público. Vamos seguir acompanhando a gestão do governador, criticando sempre que seus projetos se alinhem a interesses corporativistas em detrimento da sociedade e elogiando as medidas que venham no sentido de modernizar nossa cidade, criando as condições para melhoria nos serviços públicos e no ambiente de negócios.