Esquerda e Direita: Por que tão parecidas?, por Deborah Bizarria

August 10, 2018

Discursos sem argumentos, que apelam para o medo, são marca do populismo – seja de Esquerda ou de Direita

Cartazes do protesto em Londres no dia 14/07. No cartaz ao fundo “Nunca mais! Não aos Nazistas”


O panfleto (à direita) distribuído pelo movimento inglês Stand Up To Racism¹ durante o protesto anti-Trump de 14 de Julho em Londres é o reflexo da forma como tanto esquerda quanto direita vêm fazendo política pelo mundo. Um discurso que foca na ideia de ‘nós contra eles’, que usa apelo ao medo sem fundamentar seus argumentos.

Seria de se esperar, pelo nome do movimento – que significa algo como Enfrente o Racismo! em português – se tratar de um grupo que dá apoio aos imigrantes, contra discriminação; ou ainda um movimento que denuncia a violência contra determinados grupos ou templos religiosos, isto é, uma atuação proativa para melhorar a vida de vítimas de racismo. Mas não vi nada disso.

Sobre violência, nos panfletos, havia uma menção a uma mesquita e um templo Sikh. Embora o texto implicasse ligação de ativistas de direita no caso, nenhuma evidência disso foi apresentada. Outros 6 trechos do folheto, na seção “Robinson e seu amigos Racistas”, eram exclusivamente sobre o apoio de políticos de partidos e grupos fora da Inglaterra ao ativista de direita Tommy Robinson².

Exemplos de discurso populista e apelativo não se resumem à esquerda, nem à Europa. Não faz muito tempo, em terras brasileiras, que o MBL passou a vasculhar a vida pessoal e as postagens de jornalistas de agências de checagem de fatos, ramo também conhecido como fact-checking, ligadas ao Facebook. A denúncia consistia em “demonstrar” uma suposta ideologia do jornalista e a partir disso implicar que o jornalista era incapaz de fazer um bom trabalho. Ora, conhecendo o potencial poder dessas agências, não seria mais fácil denunciar seus erros de checagem de informação ao invés de apelar para a vida pessoal dos jornalistas?

Chamada de um do panfletos do Stand Up to Racism

O embate entre partidos e grupos de esquerda e direita tem crescido bastante nos últimos anos. Ambos apresentam narrativas muito sedutoras por serem de simples compreensão e por apresentarem um inimigo a ser combatido, seja ele o 1% mais rico, os globalistas, a extrema-direita ou os muçulmanos. Essas narrativas de tom populista além de reforçar os vieses dos seguidores, aumentam o sentimento de pertencimento ao grupo e, portanto, o espírito combativo.

Um dos espectros desses embates é a esquerda elitizada pró estado de bem-estar social, cuja preocupação com minorias os leva a uso ostensivo de boicotes sociais. Em geral, seus defensores são acadêmicos e estrelas do cinema e da música, como a atriz Meryl Streep e a cantora Beyoncé. Outro lado da disputa é dominado por uma direita protecionista, anti-imigração e, embora não seja necessariamente cristã, é anti-islamismo. Essa direita é representada por políticos e ativistas como a presidente do partido francês Frente Nacional, Marine Le Pen, o presidente dos EUA Donald Trump e a líder do partido conservador alemão AFD, Frauke Petry.

Divergências religiosas, especialmente em países multiétnicos, também acabam servindo de ‘desculpa’ para radicalizações. No Brasil, isso é bem claro se analisarmos as negociações da chamada bancada evangélica no Congresso ou a polêmica envolvendo o prefeito carioca, Marcelo Crivella, que teria prometido vantagens a líderes evangélicos em troca de apoio. Assim que foi denunciado, Crivella passou a usar o argumento de perseguição religiosa, quando na verdade a fé serve de mera embalagem para velhas práticas políticas. O mesmo acontece em outro países, como a Índia, em que alguns políticos se aproveitam da preponderância do hinduísmo ou da fragilidade política e representativa de religiões minoritárias para ganhar visibilidade.

Atacando adversários através de rótulos ideológicos ao invés de considerar suas ações ou propostas é o mecanismo que tem nos levado ao empobrecimento do debate público. A polarização consequente não só dificulta qualquer diálogo democrático e o desenvolvimento das sociedades, como acaba por balançar ou romper mesmo relações amigáveis. Os únicos a se beneficiarem da adesão a esse tipo de militância são os extremistas. Todo o resto:eu, você, o “petralha”, o “coxinha”, o país saem perdendo.

¹ Segue uma tradução de trecho da descrição do movimento em seu próprio site: “Uma ofensiva racista está varrendo a Europa, com os governos e a mídia de direita usando migrantes, refugiados e muçulmanos como bodes expiatórios para uma crise econômica e guerras que eles não criaram. A maré racista só será repelida pelos antirracistas em pé e confrontados. Da Alemanha à Grécia e aos EUA, pessoas que querem uma sociedade livre do racismo não estão dizendo mais nada. As pessoas estão indo às ruas em grande número para se opor ao racismo, islamofobia, anti-semitismo e dizer que migrantes e refugiados são bem-vindos aqui.(…)”

² Robinson ficou conhecido por suas marchas de rua e manifestações em cidades. De acordo com o The Guardian, o motivo do apoio a Robinson foi sua prisão por transmitir um vídeo de uma hora no Facebook de fora do tribunal de Leeds. No vídeo, ele fez comentários que arriscaram o cancelamento de um julgamento. Declarou-se culpado de desrespeito ao tribunal. Ele foi preso, acusado e sentenciado em cinco horas.

Deborah Bizarria é estudante de economia na UFPE, coordenadora estadual do Students for Liberty Brasil e colaboradora do Livres-PE.