Clube de Artes e Cultura do Livres homenageia Nelson Rodrigues

May 6, 2021

A Setorial de Artes e Cultura do LIVRES foi criada em Fevereiro de 2020. Atuamos dentro e fora do movimento para colocar os ideais da Liberdade num campo dominado por setores da Esquerda mais obsoleta. Também enfrentamos o sucateamento e desmonte da Cultura por parte do Governo Federal.

Nosso trabalho é conduzido em três eixos de atuação:

– Pesquisa e Conteúdo de Arte e Cultura: buscamos disseminar as mais diversas expressões artísticas por meio de textos, eventos virtuais e debates internos. Também indicamos obras que tenham os valores liberais no seu núcleo.

– Política e Ativismo: procuramos nos envolver na legislação que impacta as atividades artísticas e culturais. Realizamos debates internos sobre a atuação de parlamentares e dirigentes, notas a respeito do que concordamos e discordamos, além da participação de alguns de nossos membros em comissões e conselhos do setor em suas cidades.

– Desenvolvimento e Criação de Artes e Cultura: nossos participantes criam, em suas áreas de atuação, manifestações artísticas e culturais que trazem, em seu conteúdo, o tema da Liberdade.

Em 2021, a setorial de Artes e Cultura foi transformada em Clube de Artes e Cultura. Nossos eixos continuam os mesmos e nossa atuação será ainda mais presente dentro do movimento.

Nossa primeira ação foi homenagear um artista para batizar o Clube. O eleito foi o dramaturgo recifense Nelson Rodrigues, o nome mais influente do Teatro brasileiro. Nelson Rodrigues também jornalista, cronista, romancista, contista e um apaixonado por futebol.

Agora, somos o Clube Nelson Rodrigues de Artes e Cultura.

Em suas peças, Nelson colocou o dedo na ferida ao retratar o cinismo de parte da tradicional família brasileira, seja da elite ou da classe média. Bonitinha, Mas OrdináriaOs Sete Gatinhos e O Beijo no Asfalto retratam esse falso conservadorismo nos patriarcas Werneck, Noronha e Aprígio. O Beijo no Asfalto também denuncia o pior jornalismo sensacionalista praticado no Brasil.

Porém, por ser crítico do totalitarismo soviético e das atrocidades cometidas por Stalin, Nelson Rodrigues teve sua imagem associada à nossa Ditadura Militar e foi exaustivamente chamado de reacionário, como ponderou o professor de Literatura Luís Augusto Fischer: “Junte o maio de 68 francês, a chegada da pílula, canção popular e festivais, a corrida espacial que foi o auge da Guerra Fria, tudo agravado pelo Golpe de 64. É nesse ambiente que Nelson se apresenta como reacionário”. Nelson pode ser mais bem retratado pela definição do artista plástico, escritor e ensaísta Nuno Ramos, que vê na obra do dramaturgo um eterno retorno ao arcaico: Nelson é “como uma má notícia ambulante a assombrar a velocidade do mundo lá fora”.

Contudo, suas atitudes nem sempre foram bem recebidas pelos militares e pelos grupos que se diziam conservadores. Afinal, sua imagem ainda estava ligada às obscenidades representadas em suas peças; a família brasileira não havia esquecido do Nelson subversivo que, hoje, fariam qualquer bolsonarista chamá-lo de comunista e persegui-lo nas redes sociais.

Por isso é complexo descrever esse gênio singular no que tange à política propriamente dita.

Nelson era um anti-comunista pichado de reacionário num país muito polarizado por questões ideológicas.

Por causa dessa dicotomia, Nelson negou cegamente a tortura da Ditadura Militar, dizendo que eram mentiras dos esquerdistas – como fazem hoje os saudosos da Ditadura. Até que a tortura chegou à sua família.

Seu filho Nelsinho se envolveu nos protestos de 1968 e ingressou na luta armada pelo MR-8. O choque ideológico nunca desatou os laços afetivos entre pai e filho, fato comprovado em cartas que trocavam mesmo após Nelsinho ter se tornado foragido. Quando Nelsinho foi preso e torturado, Nelson conseguiu permissão para vê-lo e perguntou a seu filho se ele havia sido torturado. Barbaramente, disse o filho. Assim, Nelson descobriu que a Ditadura realmente torturava pessoas.

Surge então um Nelson humanista, que usava de sua proximidade dos militares para libertar jovens prisioneiros do regime. Descobrir a tortura foi o ponto final na defesa do regime que se igualou à versão comunista da ditadura no que ele mais combatia: o fim da Liberdade. Nelson também iniciou uma grande campanha para que torturadores não fossem anistiados, antes disso ser uma pauta nacional.

Segundo Sábato Magaldi, “Nelson Rodrigues foi reacionário apenas na medida em que não aceitou a submissão do indivíduo a qualquer regime totalitário”.

Compatíveis com essa visão humanista são as posições de Nelson a respeito de racismo e homossexualismo. O esperado de qualquer pessoa realmente  “reacionário” seria que ele reforçasse qualquer preconceito. Pois Nelson criou todo um enredo trágico em torno de um beijo gay, em O Beijo no Asfalto. E, irmão do Mário Filho que em 1947 publicou o ensaio interpretativo O Negro no Futebol Brasileiro, depois de celebrizar os craques mulatos em crônicas, escreveu em 1946 a peça Anjo Negro para colocar no centro do palco o racismo velado do país. E brigou (mesmo perdendo) para que o protagonista fosse representado não por um ator branco com o rosto pintado de preto, como era comum na época, mas por um ator negro, Abdias do Nascimento, para quem havia escrito o texto. “Retratando e levando às últimas consequências os estereótipos racistas cultivados pela nossa ‘democracia racial’, Nelson demolia as absurdas pretensões à harmonia racial”, declarou Nascimento.

De fato, não dá para rotular Nelson Rodrigues. Ele transcendeu qualquer rótulo simplista que lhe fora dado na época e qualquer rótulo que possam tentar auferi-lo na atualidade: “Realmente, eu sou um libertário”, Nelson Rodrigues assumiu, ironicamente, o epíteto que lhe reservaram para o final da vida.