7 motivos para ser contra o Distritão

August 10, 2021

Democracia

A Câmara dos Deputados debate a PEC 125/2021 com o objetivo de promover a alteração do sistema eleitoral brasileiro. O parecer da relatora, deputada Renata Abreu (Podemos-SP), propõe a adoção do chamado “Distritão” para as eleições de 2022 como uma transição para um “Distritão Misto” a partir de 2026.

Afinal, por que isso é prejudicial para a democracia brasileira?

1. Redução na oferta de candidaturas com a consequente redução da possibilidade de renovação política

No atual modelo de lista aberta, os partidos precisam que suas listas atinjam o quociente eleitoral para garantir cadeiras. Assim, apesar da negativa competição entre candidatos do mesmo partido, um candidato depende de outro para que juntos possam garantir uma boa votação da lista. Desse modo, partidos tendem a lançar um número elevado de candidatos para apreciação do eleitor.

No Distritão, os partidos políticos podem lançar candidatos até o número de cadeiras em disputa. No entanto, esse incentivo sequer existe. Tendo em vista que para ser eleito o candidato deverá estar entre os mais votados de todo o estado, o incentivo lógico é que os partidos reduzam sua oferta de candidaturas a poucos candidatos como forma de evitar a diluição dos votos entre candidatos de um mesmo partido.

Assim, em uma Unidade da Federação como o Distrito Federal, que tem 8 cadeiras na Câmara dos Deputados, um partido poderia lançar apenas dois candidatos com o objetivo de concentrar sua votação neles. Obviamente, tais candidatos privilegiados pelos partidos políticos serão aqueles que já contam com mandato ou com uma grande exposição pública. Assim, devemos assistir a uma queda significativa da renovação política nas casas legislativas.

2. Enfraquecimento dos Partidos Políticos e danos à governabilidade

Ao escolher um partido político pelo qual se candidatar, um postulante leva em conta a força da lista daquele partido. Todos sabem que sozinhos, por mais votos individuais que tenham, dificilmente serão eleitos. Assim, os partidos políticos funcionam como organizadores das candidaturas, agregando candidatos em suas listas para apresentar à sociedade.

O Distritão mata a lógica partidária da eleição e transforma os partidos em meros cartórios para registro de candidatura e fonte de financiamento. Um candidato com 50 mil votos assim o será no Partido A ou no Partido Z. Sem o caráter proporcional que exige uma mínima cooperação para o sucesso da lista partidária o sistema vira um “cada um por si” onde o que importa é única e exclusivamente o interesse do candidato.

Em um sistema partidário extremamente pulverizado como o Brasileiro, o Distritão pode gerar uma pulverização individual com 513 “partidos” diferentes no âmbito da Câmara dos Deputados. Assim, presidentes teriam imensa dificuldade de formação de coalizões governamentais, encarecendo o custo de manutenção da coalizão com negociações ainda mais no varejo e instabilidade política.

3. Desperdício de votos

Por ser um sistema majoritário, o Distritão gera desperdício de votos em distritos com muitos representantes. Em um cenário com várias candidaturas pulverizadas, os votos dados a qualquer candidato que não tenha sido eleito serão descartados.

Retomando o exemplo do Distrito Federal, apenas os votos dados aos 8 candidatos mais votados teriam “utilidade” na conversão de votos em cadeiras. Enquanto o sistema proporcional utiliza todos esses votos para a lista partidária, o sistema majoritário vai descartá-los, agravando a crise de representatividade.

4. Encarecimento das campanhas exclusão de minorias políticas

Apesar de não alterar a circunscrição eleitoral (o estado), o Distritão rompe com a lógica de cooperação mínima entre candidatos de um mesmo partido. Com sua adoção, um candidato terá que se esforçar para estar entre os mais votados do seu estado.

Em um cenário em que muitos candidatos regionais cooperam para fortalecimento de uma lista conjunta, os custos das campanhas já são elevados. Com a adoção de um sistema em que esses votos entre candidatos de um mesmo partido não são transferidos, candidatos terão que ampliar suas campanhas para todo o estado, o que gera elevação dos custos das campanhas políticas no Brasil. Tomemos como exemplo o Estado de São Paulo. Um candidato teria que fazer campanha em todo o estado, buscando ser um dos 70 mais votados.

Essa elevação dos custos das campanhas também é um incentivo para um menor número de candidatos, tendo em vista que os partidos vão preferir concentrar recursos em poucos candidatos, tornando impossível ser eleito sem uma fortuna à disposição.

Da mesma forma, ao desperdiçar votos o Distritão tende a mitigar a representação das minorias políticas nas casas legislativas. Isso porque hoje, com uma lista somando forças, partidos mais ideológicos podem atingir o quociente eleitoral ou ter bom posicionamento na distribuição das sobras.

Com o Distritão, partidos que não tiverem um candidato individualmente bem votado ficarão excluídos do legislativo, mesmo que coletivamente sejam uma força relevante no país.

5. Agrava a competição entre candidatos de um mesmo partido

Hoje os candidatos dentro de um mesmo partido competem para liderar a lista partidária, mas permanece o incentivo para cooperação mínima já que não basta boa votação individual, a lista deve ser bem votada.

Com o Distritão, tal cooperação deixa de existir, tornando qualquer outro candidato (do seu partido ou não) um concorrente direto a ser vencido.

6. Não aproxima eleitores de eleitos

Uma das vantagens claras dos sistemas majoritários em distritos uninominais (voto distrital) é a proximidade geográfica entre representantes e representados. Cada distrito tem um deputado, conhecido pela população local, que consegue exercer pressão sobre ele.

O Distritão em nada colabora para aumentar a representação regional nas casas legislativas. Também não colabora para um debate nacional e ideológico como o sistema proporcional de lista fechada. O Distritão continua a contar com muitos representantes eleitos pela mesma circunscrição, dificultando inclusive que o eleitor saiba quem são seus deputados.

Em um mar de 70 deputados federais como tem São Paulo, o Distritão em nada contribui para aumentar accountability, pelo contrário. Com os votos dados aos não-eleitos desperdiçados, haverá um número ainda maior de eleitores “sem representante”.

7. O risco de se comprar gato por lebre

Ao atrelar a aprovação de um sistema “Distrital Misto” a uma transição através do Distritão, o parecer da relatora é um tiro no escuro que pode, ao fim, perpetuar o próprio Distritão. Afinal, por que haveríamos de imaginar que uma legislatura eleita pelo Distritão se furtaria de promover nova alteração para manter permanente o modelo?

Os incentivos de manutenção do modelo por uma legislatura eleita justamente por tais regras são muito mais elevados. Tal risco fica evidente quando verificamos que não há atrelamento lógico entre a adoção do Distritão e a adoção de um modelo misto. Tal transição poderia ser feita com o atual modelo proporcional de lista aberta, que pela proposta da relatora seria usado para eleição de metade das cadeiras a partir de 2026.

Assim, a proposta apresentada visa mudar completamente da lista aberta para um sistema majoritário em distritos plurinominais (Distritão), para aí caminhar em 2026 para que metade das cadeiras sejam preenchidas por um sistema misto com voto majoritário em distritos uninominais (Distrital Puro) e a outra metade pelo atual voto proporcional de lista aberta.

Ou seja, abandonaríamos a lista aberta apenas para as eleições de 2022 para retornar com ela em 2026. O lógico seria manter a lista aberta e caminhar para distritalizar a metade das cadeiras a partir de 2026. Aceitar o Distritão como transição para um modelo misto pode ser apostar no misto e acabar com o Distritão permanente.

Trecho retirado da nota técnica do Livres sobre a PEC 25/2021. Confira na íntegra aqui.