O PT era uma peça. Vamos desmontar o tabuleiro?

April 8, 2018

Vivemos um momento único na nossa história. A prisão do ex-presidente Lula representa um melancólico e derradeiro capítulo na trajetória de fraudes e saques do Partido dos Trabalhadores, mas também pode ser muito mais do que isso. Se agora o rei foi derrubado no tabuleiro da corrupção, precisamos nos mobilizar para desmontar o tabuleiro por completo. Ou logo surgirá um outro rei para ocupar o vácuo.

Maior líder do PT e grande protagonista da política brasileira nas últimas décadas, Lula foi também o melhor amigo das empreiteiras e o maior símbolo do modelo atual de funcionamento do Estado brasileiro, baseado no capitalismo de compadrio. Nas palavras do ministro do STF Luís Roberto Barroso, trata-se de um grande pacto oligárquico entre políticos, funcionários públicos de alto escalão e grandes empresários para garantir privilégios aos amigos do rei e saquear sistematicamente o dinheiro dos pagadores de impostos. Tudo embalado com o ilusionismo de um discurso populista. Todos nós sabemos que o PT, apesar de seu protagonismo, não é o único partido a participar do esquema.

Esse mecanismo complexo, produzido ao longo de décadas, consiste em um Estado gordo e com amplos tentáculos, que atua sistematicamente para favorecer a elite política e os empresários amigos, além dos famosos operadores do sistema, que são os doleiros e os dirigentes de estatais. O mecanismo está entranhado no Estado brasileiro. Não só no governo federal, mas também nos governos estaduais e municipais. Ele não atua somente através das empresas estatais, mas também em regulações do mercado, subsídios empresariais e protecionismos, sempre sob medida para o benefício dessas cúpulas.

O mecanismo é o tabuleiro que precisa ser desmontado. E a punição de todos os poderosos envolvidos é só uma parte das ações necessárias para esse desmonte. Depois de Lula, ainda faltam muitos. Pense nos deputados e senadores que respondem a inúmeros processos, mas seguem até agora protegidos pelo Foro Privilegiado, que precisa ser extinto: Aécio Neves, Lindbergh Farias, Gleisi Hoffmann, Renan Calheiros…

Além de punir os corruptos, precisamos eliminar as oportunidades para a corrupção. Nunca foi tão urgente privatizar todas as estatais. Como já demonstrou Elena Landau em brilhante artigo para a Folha de São Paulo, a Constituição é clara ao dizer que não são as privatizações que precisam ser justificadas, mas as estatais. E não há justificativa razoável para manter a imensa maioria delas.

Precisamos de uma reforma profunda do Estado brasileiro, com uma simplificação radical da legislação. Não é sem propósito a complexidade do nosso aparato regulatório, cheio de exceções para o benefício dos amigos do poder. A operação Lava Jato expôs com detalhes que os benefícios regulatórios são vendidos pelos políticos corruptos para os seus sócios empresariais. E isso também ocorre para o benefício das corporações. Como já disseram os brilhantes economistas Marcos Lisboa e Zeina Latif, o Brasil precisa deixar de ser o país da meia-entrada. As políticas públicas precisam ter avaliações rigorosas e objetivas, com prazos e responsabilizações. Funcionários públicos ineficientes devem ser demitidos, bem como o mérito deve ser recompensado.

Nossas instituições precisam ser fortalecidas, aprofundando os valores democráticos e liberais, com equilíbrio entre os poderes e absoluta igualdade perante a lei. Essa é uma construção diária. Não podemos cair em certa ilusão populista de achar que Lula centralizava os problema do Brasil. Se o mundo não acaba com sua prisão, como aparenta para os petistas, também não se inicia uma utopia. Os brasileiros seguirão trabalhando, amando, sofrendo e sorrindo, vivendo suas vidas individuais – o maior de todos os valores. E alguns bandidos ainda estarão ocupando cargos importantes no país. Porque os problemas não se resolvem magicamente. Nem por meio de mitos salvadores da pátria.

Desmontar o mecanismo é uma tarefa complexa, mas que já foi iniciada. Precisamos atuar com inteligência e mobilização para que essa tarefa chegue até o fim, renovando o Congresso e realizando as reformas tão necessárias. A democracia brasileira venceu a inflação e diminuiu a miséria. É aprofundando o amadurecimento da nossa democracia que agora vamos vencer a corrupção sistêmica.

O PT era uma peça. Precisamos desmontar o tabuleiro.
Vamos ser Livres.