Turbulências à frente na novela orçamentária

October 9, 2021

Faltam R$ 20 bi para atender todas as demandas do Executivo e Legislativo

Os gastos atendem ao teto (R$ 1,6 trilhão). A proposta orçamentária inclui no teto dos gastos a conta das dívidas judiciais de R$90 bilhões.

No entanto, diversos itens ficaram de fora. O orçamento considera que a inflação de 2021 será de 6,2%. Sabemos que o ano fechará com inflação em 9%. Assim, a correção monetária do salário mínimo, que indexa diversos benefícios, elevará o gasto em R$ 20 bilhões, aproximadamente.

Os deputados demandam R$ 20 bilhões de emendas de relator para seu orçamento paralelo. O presidente Bolsonaro deseja uns R$ 25 bilhões para ter um programa social de combate à pobreza que substitua o programa Bolsa Família e possa ser vitrine na disputa eleitoral com o ex-presidente Lula. Finalmente, os empresários desejam a manutenção por mais quatro anos da desoneração da folha de salários, o que adicionará uns R$ 5 bilhões ao gasto em 2022.

Somando os quatro itens “faltam” cerca de R$ 70 bilhões para fechar o Orçamento.

Um primeiro passo foi dado na semana passada. Foi apresentado o relatório do deputado Hugo Motta, do MDB da Paraíba, do Projeto de Emenda Constitucional (PEC) que trata do pagamento das dívidas judiciais pela União.

Dos R$ 90 bilhões de dívidas judiciais, a PEC estabelece que R$ 40 bilhões serão pagos normalmente dentro do teto. Serão as dívidas menores, fruto de processos relativos a benefícios previdenciários e outros ligados a benefícios do Estado de bem-estar, além de dívidas trabalhistas com servidores.

O saldo restante de dívidas judiciais, R$ 50 bilhões, será pago sob negociação nos termos estabelecido pela PEC –por exemplo, acerto de contas com governos estaduais que têm dívidas com a União, ou com uma redução de 40% no valor do débito, entre outras possibilidades– e serão considerados extrateto.

Assim, abriu-se espaço de R$ 50 bilhões dentro do teto. Como vimos, as demandas totalizam R$ 70 bilhões. Faltam, portanto, R$ 20 bilhões. Aí está a fonte das turbulências que teremos nas próximas semanas.

Os políticos lutarão por uma solução que abra mais espaço dentro do teto dos gastos. Uma possibilidade é alegar que ainda estamos convivendo com a epidemia, o que requererá uma extensão do auxílio emergencial (AE) por mais um ano. Parte do gasto orçado para o programa Bolsa Família seria pago na forma de AE, portanto, extrateto, financiado por meio de um crédito extraordinário. Esta parcela do Bolsa Família sairia do teto.

ministro da economia, Paulo Guedes, e sua equipe já sinalizaram que não aceitam esta solução. Não ficarei surpreso se PG ameaçar demissão e o câmbio novamente atingir cotações próximas de R$ 6.

Não surpreende, portanto, que o caso dos investimentos do ministro no exterior, de conhecimento há anos da comissão de ética, somente agora, no momento que se discute o Orçamento de 2022, tenha vindo à tona.

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Com grande alegria leio na imprensa do uso corrente da primeira vacina contra a malária. Sua confecção contou com contribuição decisiva do casal de cientistas brasileiros radicados em Nova York, Ruth e Victor Nussenzweig.

A ditadura militar fez com que perdêssemos esses cientistas. O casal iniciou a carreira acadêmica no departamento de Parasitologia da Medicina da USP, liderado por meu avô. Desde criança sabia que esse momento chegaria. Minha avó Jovina sempre falava: Ruth e Victor estão atrás da vacina! O momento chegou.

Aparentemente o governo Bolsonaro pretende potencializar a fuga de cérebros, reduzindo muito os recursos do Ministério da Ciência. Perderemos novos casais Nussenzweig.