Os desastres climáticos de Petrópolis e os ensinamentos do estoicismo

March 24, 2022

Ambiente

Artigo publicado originalmente no Diário do Rio. Confira na íntegra aqui.

Moradias e comércios destruídos, ruas alagadas e a cidade embaixo d’água, com tempestades intermináveis e múltiplas áreas com riscos de deslizamentos. Várias pessoas mortas e algumas desaparecidas. Tudo isso por conta das chuvas de verão, repentinas e com um volume de água fora da normalidade, que geraram prejuízos imensuráveis para Petrópolis e seus moradores.

Esse relato poderia ter sido feito para descrever os acontecimentos nessa cidade há cerca de 11 anos, em 2011. Mas segue sendo usado para relatar o que ocorreu no mês passado nesse mesmo local. E até para falar sobre as notícias do último domingo, no dia 20 de março de 2022.

Todo esse contexto evidencia um fato cada dia mais inquestionável: esse cenário catastrófico deixou de ser um evento inesperado. E continuará ocorrendo nos próximos anos – com muitas mortes e destruição evitáveis -, se a postura do poder público não mudar por completo.

Mais do que mudar a postura, será preciso que as autoridades tenham um novo olhar sobre a situação. Quem sabe, inspirados pelos ensinamentos do estoicismo.

Como dizia Marco Aurélio, Imperador Romano que se tornou um dos grandes expoentes dessa corrente filosófica, “muitas vezes erra não apenas quem faz, mas também quem deixa de fazer”. Um comportamento estóico exige que se tenha controle absoluto de toda a situação que está ao seu alcance. Requer que se assuma a responsabilidade pelas suas ações, mas também por suas omissões.

Esse novo olhar pode ser valioso justamente por ser um ponto de vista que parece ser completamente ignorado pelo Poder Público, em especial a Prefeitura de Petrópolis e o Governo do Estado do RJ.

Não à toa, após os desastres de 2011, foi instalada uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na ALERJ para investigar os acontecimentos, e 42 recomendações foram indicadas para evitar novas catástrofes nesta Região. Para além disso, quase 400 milhões de reais foram alocados para essa finalidade. E, no fim das contas, quase nada saiu do papel.

Mostra-se urgente exigir esse novo olhar, em que as autoridades competentes – em ação coordenada entre a União, o Governo do RJ e a prefeitura de Petrópolis – assumam o controle da situação, com planejamento estratégico e execução a partir de projetos de adaptação e mitigação. Isso significaria pensar e agir com base em ações a curto, médio e longo prazo, efetivas para amenizar danos futuros já anunciados.

Esse novo olhar seria, desse modo, investir em tecnologias que auxiliem na previsão de fenômenos como esse. Seria também desenvolver um planejamento urbano sustentável, a partir de um programa de habitação de interesse social, realocando moradores que vivem em espaços que não devem ser habitados. E, por fim, seria executar um plano de controle ambiental, recuperando encostas e reflorestando as margens dos rios.

Segundo o relatório do Painel intergovernamental de mudança do clima da ONU (IPCC), o aquecimento médio do planeta em 1º C – que está ocorrendo atualmente -, fará com que as inundações por todo o planeta aumentem em 30%. Isso está documentado e comprovado em dados, e, inevitavelmente, também terá efeitos na região serrana do RJ.

A situação está posta. Infelizmente, ao menos a curto prazo, as mudanças climáticas vão continuar acontecendo e, para evitar seus prejuízos, é preciso agir com esse novo olhar. Que, enfim, as autoridades adquiram o controle da situação e comecem a atuar com responsabilidade. É preciso, enfim, que se inspirem no estoicismo.